Aterrámos no Cairo quase uma hora depois do previsto porque o concerto atrasou-se. Do outro lado espera-nos Nadah El Shazly. Encontramo-la atrás de um ecrã à procura dos samples de Ahwar. É uma Nadah mais Dj do que cantora que utiliza as batidas instáveis e outras camadas sonoras para dar margem à sua voz grave e limpa. Ainda é cedo para mostrar o poder que ela tem. O público parece um pouco constrangido, não se mexe e pouco interage.
Em Novembro do ano passado a egípcia lança Ahwar (Arabic for Marshlands), que em português significa pântanos, é um álbum que merece ser escutado repetidas vezes. Um trabalho composto, criado e produzido por si em colaboração com os The Dwarfs of East Agouza (Marice Louca e Sam Shalabi). A compositora egípcia tem caído na boca dos promotores de festivais influentes: Norbergfestival, Clandestino festival, Heart of Noise, Le Guess Who?, Supersonic e, por consequência, o seu nome tem circulado por outros meios também. Ahwar abre-se a dois mundos: oriente e ocidente, um álbum que foi criado entre dois continentes, Canadá e Egipto. Há hieróglifos sonoros que não se decifram facilmente e sons jazzísticos que revelam uma Nadah ecléctica.
Nadah lembra-nos os graves de Sussan Deyhim e a doçura de Yasmine Hamdan. Não se mostra estridente e canta com suavidade os H's do árabe moderno, língua que nem sempre foi falada pelos egípcios. Se fecharmos os olhos sentimo-nos num bar underground no coração do Cairo cheio de fumo de shisha que serpenteia em movimentos curtos. Os graves de Nadah deambulam e mostram-se lentamente fortes, envolvendo-nos com elegância. Durante todo o concerto Nadah não conversou muito com o público. Mas já perto do fim disse-nos que seria o último concerto desta digressão e que os seus instrumentos eram danificados pelos funcionários do aeroporto sempre que embarcava. Sugeriu que os músicos deveriam ter um avião especial para viajarem.
Se
Nadah viesse acompanhada por banda talvez o concerto teria outro impacto, no
entanto mostrou-se competente e capaz de enfrentar o público. Ainda que ao
abrirmos os olhos voltássemos à realidade de que afinal não estávamos no Cairo
(infelizmente), Nadah soprou-nos um pouco desse cheiro tão condimentado.
- TRANSLATION -
We land on Cairo almost an hour after scheduled because the
show was delayed. On the other side, Nadah El Shazly awaits us. We find her
behind a screen looking for Ahwar samples. It's a Nadah that is more of a Dj
than a singer and that uses unstable and frantic beats as well as other
soundscapes to pave the way for her deep but clear voice. It's still early to
show the power her voice has. The audience seems a little constrained, it does
not move or interact.
In November of last
year, the egypcian released Ahwar (Arabic for Marshlands) that in portuguese means swamps. It's a recorded that deserved to
be listened several times. A work that was composed, created and produced by
herself in collaboration with The Dwarfs of East Agouza (Marice Louca and Sam
Shalabi). The egypcian composer has been the talk of the promoters of several
music festivals such as: Norbergfestival, Clandestino festival,
Heart of Noise, Le Guess Who?, Supersonic, and as a result of that, her name
has travelled among other circuits as well. Ahwar opens itself to two worlds:
east and west, a record that was created between two continents, Canada
and Egypt. There are sound hieroglyphs that are not easily solved and jazzy
sounds that reveal an ecletic Nadah.
Nadah reminds
us of the deep voice of Sussan Deyhim and the sweetness of Yasmine Hamdan. She
is not the least screechy and sings with softness the H's of modern arabic, a
language that was not always spoken by egyptians. If we close our eyes, we feel
like we are in an underground bar at the heart of Cairo filled with shisha
smoke that meanders in short movements. The deep voice of Nadah wanders around
and slowly but strongly embraces us with elegance and charm. During the show,
Nadah didn't talk much with the audience but right at the end she informed us
that it would be the last show of the tour and that the musical instruments
were damaged by the airport employees everytime she travelled. She suggested
that musicians should have a special plane in order to travel.
If Nadah was
accompanied by a band maybe the show would have had another impact, however she
was competent and capable of facing the audience. Even though as we opened our
eyes we didn't find ourselves in Cairo (unfortunately), Nadah blew us a little
of that so spicy smell.
TEXTO e IMAGEM / TEXT and IMAGE: PRISCILLA FONTOURA
IMAGEM / IMAGE: SP
TRADUÇÃO / TRANSLATION: CLÁUDIA ZAFRE
LOCAL / VENUE: SUBPALCO, RIVOLI
DATA / DATE: 13 de Abril, 2018