CONAN E OMAR – O BARBARISMO DA HYPE
Sabia que ia assistir a duas actuações que não iam envolver guitarras ou grandes dotes poéticos, no entanto, estava de mente aberta para a tal festa que se avizinhava. Estava na segunda fila à espera da entrada do tão mencionado pelos media musicais, Conan Osíris. Admito que a minha decisão de me pirar para o fundo da sala, ocorreu de forma brusca mas extremamente racional. Foi nessa altura que por cima de batidas pouco inspiradas, uma salganhada de sons que pareciam ter sido feitos por uma pessoa que experimenta pela primeira vez o garage band, Conan Osíris cantou ou entoou que era um borrego ou que foi um borrego. Nada a refutar.
Já no fundo da sala, consegui admirar todo o enlevo e devoção que a audiência parecia prestar a esse novo génio musical elegido pelos especialistas de música. As letras (quando se percebia alguma coisa delas) discorriam sobre o facto de se estar sem paciência (coisa com que de facto me identifiquei), ter celulite ou celulitite e algo sobre saltar do Titanic (mais uma vez não refutaria). Letras extremamente pobres, sem qualquer tipo de humor e cujo único sentido que lhes posso legitimar é a exaltação da mediocridade.
A actuação durou perto de uma hora e foram “tocados” cerca de nove temas. Entretanto, dei por mim envolvida num flow de consciência. Por que é que os cães ladram sempre aos carteiros. A dificuldade de comprar ovos brancos, são sempre de cor creme. A data da invenção do pão branco fatiado para consumo das massas. E a sexualidade de Rock Hudson. Todas essas questões me assaltaram a mente e protegeram de certa forma a minha consciência da torrente de banalidade que jorrava do palco. Acho que foi a primeira vez que fiquei contente por não haver encore num concerto.
Passado um bocado, foi a vez de Omar Souleyman subir ao palco com mais um amigo que se encarregou da música propriamente dita por trás de um órgão enorme.
A actuação até começou bem, batidas um pouco firmes mas acompanhadas de ritmos de inspiração árabe. No entanto, cedo deu lugar para uma panóplia de temas que pareciam todos iguais.
Batidas techno desinspiradas aliadas a apontamentos reminiscentes de disco sound americano dos anos 70 mais passagens que fazem lembrar aquelas músicas comerciais que tocam à beira da piscina. As letras, não posso falar muito sobre elas porque não sei árabe. No entanto, Omar Souleyman podia estar a debitar a receita para fazer um pudim de arroz perfeito que ia arrastar a audiência num perfeito delírio. Não eram certamente poemas de origem sufista.
Voltei a ficar contente por não ter havido encore. Foram duas actuações de sonoridades entediantes e sem qualquer espécie de alma. A próxima vez que se quiser festa, aconselho ir a um baile de aldeia ou ter a sorte de apanhar algum concerto do Quim Barreiros.
É mais uma vez a vitória do hype que catapulta nomes sem qualquer rigor ou critério, criando fenómenos supostamente musicais que primam pela mediocridade e falta de qualidade a todos os níveis.
Esta é apenas a minha análise e tomando de empréstimo mais uma letra brilhante de Conan Osíris, “'tou-me a cagar”. Mas sei que no fundo, ele deve estar contente por fazer tanto sucesso com tão pouca qualidade.
TEXTO: CLÁUDIA ZAFRE
CONAN OSIRIS + OMAR SOULEYMAN
Passava já das 00h30m quando Conan Osiris entrou em cena. Um one man show com playback instrumental, aonde foi desfiando a sua música mesclada de hip-hop, eletrónica, sons ciganos e árabes, com letras carregadas de um humor muito particular. Foram 9 os temas que interpretou, sempre com o apoio de um considerável número de fiéis conhecedores das suas canções. Foram momentos especiais de animação os temas “Borrego”, “Titanique”, “Adoro bolos” e o inevitável “Celulitite”. Foi a primeira vez que o vi ao vivo e confesso que não me causou uma impressão por aí além. Foi divertido, mas apenas q.b. Uma “boa imprensa” e ser a novidade do momento por enquanto ajuda, mas poderá não ser suficiente para se fazer uma carreira musical para lá da animação de eventos e festas.
Foi também animando festas na sua terra natal que o sírio Omar Souleyman iniciou a sua carreira. Aqui o efeito novidade não pesou, pois já o tinha visto ao vivo. Foi mais do mesmo e aquilo que eu esperava, numa actuação que não terá durado uma hora e sem direito a encore. Acompanhado por um teclista, foi com a sonoridade árabe que Omar inundou a sala e provocou a animação geral. Sem grande exuberância em palco, foi sempre interagindo com o público de forma simpática e comunicativa. O público, esse, respondeu sempre de forma exuberante, especialmente quando do Korg saíram os primeiros acordes de Ya Bnayya. Tinha chegado o tempo do mosh e do agitar mais violento. Uns minutos depois, tão tranquilamente como entrou em palco, Omar saiu de cena, deixando uma sensação de ter sabido a pouco para quem lá estava para uma noite de diversão pura.
Resumindo este concerto: foi dançar, abanar o corpo, bater palmas, enfim, festa pura sem qualquer critério quanto à qualidade musical. Por vezes sabe bem, mas não é para repetir muitas vezes. Há muito tempo já com lotação esgotada, causa-me algum desconsolo lembrar que há uma semana atrás, nesta mesma sala e por menos de metade do preço deste bilhete, se ouviu música de qualidade, com instrumentos de verdade tocados por verdadeiros músicos, mas com muito menos público. Sinais dos tempos, talvez a maioria já não vá a concertos com o objectivo que deveria ser o principal: ouvir música.
TEXTO: JOSÉ MARQUES
VÍDEOS: JOSÉ MARQUES
LOCAL: Musicbox, Lisboa
DATA: 5 de Maio, 2018