Maíra Baldaia, cantautora que traz à MPB outra frescura com as suas influências afro-mineiras, regressou a Portugal para 11 datas. A compositora e cantora de Minas Gerais, acompanhada por outros músicos brasileiros, também levou as suas raízes ao Embaixada do Porto, onde antes de subir ao palco se sentou connosco na esplanada do bar que recebeu o último concerto desta digressão.
Maíra Baldaia com Guilherme Ventura
Então Maíra, estás de volta a Portugal, não é?
Exacto.
Exacto.
A digressão iniciou a 15 de Julho.
É. Eu comecei com um show no Espelho D’Água em Lisboa. E esse hoje é o 11º concerto aqui em Portugal.
Desta digressão?
Isso.
É. Eu comecei com um show no Espelho D’Água em Lisboa. E esse hoje é o 11º concerto aqui em Portugal.
Desta digressão?
Isso.
E como é que está a correr?
Foram 11 no total, não é?
Esta é a última data?
É a última data. Encerrando nesta cidade que eu acho linda, super acolhedora, estou super feliz assim.
Sim. E está a correr bem?
Sim. Tudo óptimo.
A ligação que tens a Portugal, nomeadamente ao Alentejo, acho que tens uma ligação a Portugal, pelo menos tens amigos criativos cá. Estou a falar muito rápido?
Um pouquinho.
Ok... Tu tens uma grande ligação a alguns artistas do Alentejo.
Sim.
Ou seja, a tua ligação a Portugal não tem a ver só com vires cá e apresentares os teus trabalhos, mas também já tens uma ligação emocional.
Exacto. Eu faço parte de uma rede que se chama "Em rede, Rede de Municípios pela Cultura" e foi por isso que eu comecei a vir sempre para Portugal.
Sim.
Ter contacto com vários artistas, principalmente na cidade de Serpa. Tem um produtor brasileiro que é o Cléber Camargo…
Ah, sim, sim.
…Que era a nossa ponte com Portugal e a gente veio fazendo esse intercâmbio. Então tinham espectáculos com artistas de vários países. E eu também já fiz um show com a fadista Cláudia Estrela, ela foi para o Brasil, eu apresentei aqui também.
Mas é só música? Tem a ver só com música os espectáculos?
Tem música. Tem também um pouco de dança. Tem outra artista, por exemplo que é da Espanha que se apresenta dançando. Misturam várias tradições dos países num espectáculo, num grande concerto.
Maíra Baldaia com Guilherme Ventura
De que forma é que achas que essa lusofonia, essa troca de pessoas, por exemplo, que vêm de Portugal para o Brasil ou do Brasil para Portugal ou de Moçambique, Angola. Esses países em que a língua portuguesa é falada, de que forma é que isso pode ser mais activo no Brasil? Por exemplo, porque os portugueses só são vistos como uma classe de emigrantes, mas não também como uma classe criativa, entendes?
Bom, não sei se porque eu estou mais nessa bolha de artistas, mas no meu meio, no Brasil tem muito, muito essa questão de ver os portugueses também como artistas.
Eu tenho amigos daqui. Tenho o João Pires, tenho a Cláudia Estrela, tenho várias pessoas de Portugal que circulam no mesmo meio. Então talvez seja mesmo o circuito pelo qual eu faço parte, não é? Eu acho que é importantíssimo a gente trabalhar esse intercâmbio cultural, principalmente desses países que têm essa proximidade na língua. É uma forma da gente se reconhecer, aproximar das nossas raízes e também de trocar, conhecer coisas novas, eu acho que é essencial assim.
Era isso que eu ia perguntar. De onde é que vêm as tuas raízes e como se reflecte na música que fazes?
Eu tenho muitas influências afro-mineiras. Que vêm do Congado Mineiro, vem das coisas que vieram para o Brasil, mas sobretudo da cultura Bantu que se juntou com a cultura também portuguesa com a cultura Mineira e formou o que é a cultura tradicional em Minas Gerais, mas junto a isso o meu trabalho passa muito pelo que eles dizem como Nova MPB que é a Música Popular Brasileira contemporânea que aí abraça muitas influências, então tem latinidades nesse trabalho. Tem também Blues, tem várias referências que não só as brasilidades, mas acho que, sobretudo, a mais forte é a questão ancestral, a questão do feminino.
Tu falas muito sobre o papel da mulher. Da mulher ser forte, da mulher não ser dependente, mas até ser livre na sua solidão. Achas que a questão de género ainda é um problema no Brasil?
Sim, com certeza.
Não só de género, mas de raça também.
Exacto, é o que eu ia dizer... É assim, eu acho que essas questões de género, de raça também as questões LGBT são questões que a gente tem que pôr no ar, pontuar muito porque é essencial trabalhar o respeito, trabalhar a igualdade, a igualdade de direitos, igualdade de ir e vir, eu acho que no Brasil isso tem avançado muito, mas ainda é uma luta que está pulsante e que precisa melhorar. Por isso, acho que tantos artistas levam isso como tema para as suas músicas e para os seus trabalhos porque a gente precisa chegar às mentes das pessoas de alguma forma, mostrando que somos todos iguais e que todos temos os mesmos direitos e eu acredito na arte como uma potência transformadora mesmo.
Maíra Baldaia com Guilherme Ventura
Mas por que razão é que um país tão multicultural que recebeu tantas nacionalidades e que não é assim tão antigo, como é que um país tão rico em diversidade continua ainda a lutar com o facto da mulher ser tida como submissa, outras raças são, por exemplo, nas novelas, vistas como raças de sectores menores, por que é que isso continua a ser um problema?
Eu acho que não é um problema só do Brasil.
Sim.
É uma questão que eu sinto em todos os cantos que eu vou, aqui em Portugal eu sinto, no Brasil eu sinto. Acho que é uma questão…
Mas Portugal apesar de ter recebido algumas raças, não tem esse pluralismo cultural como o Brasil, entendes?
Mas às vezes até a forma como isso se deu, não é? Politicamente. Essas pessoas foram obrigadas a se misturar com violência e com todas as questões que envolvem a escravatura, não é?
Sim.
E aí isso obviamente gera conflitos, não é? Eu acho, como você disse, o país é novo, a gente ainda está-se resolvendo, se pensarmos em comparação aos outros países, a gente está indo até rápido.
Sim.
Mas eu acho que é uma coisa que eu sinto em todos os lugares.
E tu sentes que a tua música tem chocado algumas mentalidades mais fechadas ou achas que és apenas uma mensageira que não vê reacções ainda?
Bom. Eu acho que não tive nenhum caso de alguém vir de forma agressiva para mim reclamar, mas sim já tive muitas mensagens falando que “tocou” a pessoa ou que a fez reflectir, mudar alguma postura. Na verdade é isso mas sobretudo, eu quero falar mais para as mulheres, para essas pessoas para que elas se empoderem.
Sim.
Do que para as pessoas que estão…
Oprimindo.
Oprimindo. Então eu fico mais preocupada com as reacções, não é?
Claro.
De quem está sendo…
De quem é mais passivo, não é?
Isso. Exacto.
Maíra Baldaia com Guilherme Ventura
Maíra depois desta digressão o que se segue?
Eu estou para lançar um novo trabalho no Brasil que é um DVD que eu gravei em Belo Horizonte que se chama “MAIS”. Tem várias participações especiais de artistas da cena contemporânea brasileira e aí, após esse lançamento, a gente vai seguir com esse novo show, com essa nova tourné que é um formato com banda.
Tens alguma coisa que queiras dizer aos portugueses ou alguma mensagem que queiras deixar?
Quero agradecer todos lugares que eu passei, fui muito bem acolhida, dizer que para quem quiser acessar nas redes sociais estou lá e vamos continuar nos conectando. Eu acho que o mundo é isso sem fronteiras hoje em dia e é o mais importante.
ENTREVISTA / IMAGEM: PRISCILLA FONTOURA
ENTREVISTADA: MAÍRA BALDAIA
LOCAL: EMBAIXADA DO PORTO
DATA: 30 JULHO, 2018