Estamos naquela cidade que dizem ter dado origem a Portugal, Guimarães, onde acontece a sexta edição do Mucho Flow, no Centro para os Assuntos da Arte e Arquitectura (CAAA), um festival organizado pela Revolve, promotora musical que não só organiza, mas que também gosta de música - nos dias de hoje gostar de música para quem organiza faz toda a diferença.
Estamos a ver um episódio de The End of the F# World?
Não, mas poderia ser, porque o charme indie da banda que sobe ao palco é bem cinematográfico.
Cai a gabardina do vocalista/guitarrista. Será Geordie, Morgan, Matt ou Cameron? Não se sabe, a dúvida fica no ar. Não há muita informação sobre estes quatro pequenos bons rapazes.
Corre na imprensa da especialidade que a banda inglesa tem caído nas bocas dos mais atentos às novas sonoridades. Pouco importa para quem prefere a surpresa à influência dos opinion makers. É ir ao encontro do som, porque a qualidade não depende de opiniões.
Cai a gabardina do vocalista/guitarrista. Será Geordie, Morgan, Matt ou Cameron? Não se sabe, a dúvida fica no ar. Não há muita informação sobre estes quatro pequenos bons rapazes.
Corre na imprensa da especialidade que a banda inglesa tem caído nas bocas dos mais atentos às novas sonoridades. Pouco importa para quem prefere a surpresa à influência dos opinion makers. É ir ao encontro do som, porque a qualidade não depende de opiniões.
Estes jovens britânicos parecem ter saído do subúrbio de Londres com uma atitude pouco me importa, mas, ao contrário do que parece, são muito focados no que fazem. Quase de certeza que passaram muito tempo na sala de ensaios. Há domínio dos pedais, dos instrumentos, da atitude em palco. O som que fazem não é desmazelado. Para quem acha que hoje vivemos uma falência musical, engana-se. Aqui há alma. Não trocam muitos olhares entre eles, conhecem-se bem o suficiente para darem o passo de fé que os faz tocar sem precisarem sentir o chão. As duas guitarras parecem longínquas em melodias, mas, por mais que pareçam ilógicas, são desconcertantes quando se cruzam; a aparente aleatoriedade revela uma grande densidade emocional. Talvez não saibam explicar como o fazem, talvez a psicologia o saiba, não há grandes explicações quando ao plano criativo diz respeito. Sai, assim. Apenas. E sai bem.
Quando as probabilidades parecem ser raras a encontrar uma pessoa que complemente o nosso som e identidade musical, ainda mais escassas se tornam quando envolve mais pessoas. É por isso que quando acontece esse encontro tem de ser preservado e bem cuidado, porque é invulgar encontrar quem fale a mesma linguagem musical. É isso que acontece com os Black Midi e que os torna uma banda carismática.
São quatro caminhos que os levam à mesma estrada. É nela que os BM se encontram para fazer pulsar o coração que bate, ora acelerado, ora descompassado. O baterista é ele mesmo o instrumento livre e o seu corpo o veículo das ideias que o inflamam.
São novos de idade e distintos na identidade. Há ali uma miscelânia de influências, o turbilhão de uns Liturgy, uma voz soul a roçar uma Macy Gray que, quando dá espaço ao segundo guitarrista, nos leva a uns Sonic Youth de voz grave e intimista. E, de repente, volta a cair-se no noise variável. Acaba o concerto e o vocalista/guitarrista veste a gabardina sem nunca desmontar a personagem. Até breve, esperamos.
Umas horas antes, Hilary Woods entedia o público com um espectáculo pobre em autenticidade musical que fica apenas colado a uma série de lugares comuns, tornando-se cansativo para quem espera um cenário diferente. Minimalista não significa simplório, vai muito além, porque toca no lugar mais íntimo das emoções. A irlandesa durante o concerto serviu-se do órgão e da guitarra para cantar as suas canções. A voz de boneca quebrada não se distingue do espectro de tantas outras vozes que são uma referência, como é o caso de Grouper.
Entre bandas que atraem e outras que não, (as) Mourn entram em palco com uma energia 'teen anos '90 que remonta para filmes de adolescentes. Apresentam Sorpesa Familia. O indie rock não tem que ser muito calculado, tem como capacidade trazer à memória o primeiro beijo, o primeiro grande amigo, um dia de escola. Acompanhadas por um baterista, saltam, berram, abanam a cabeça e preenchem uma hora de concerto com canções curtas que fazem o público vibrar.
Depois de algumas boas surpresas, a noite é aquecida pelas brasas vivas dos Fire!. A banda escandinava, que ainda há pouco esteve no Serralves em Festa, prendeu a atenção do público que esteve no Mucho Flow.
Sente-se o prazer dos Fire!. Não há tédio naquele palco. Pelo contrário. Há paixão ardente, fogo bem aceso, um toque tanto sensível quanto pesado, causados pela repetição do baixo de Johan Berthling que serve de base para as extrapolações da locomotiva acelerada de Andreas Werlin e da chaminé de Mats Gustafsson. São músicos experientes que fecham os olhos quando tocam, movidos pela linguagem universal que une diferentes culturas e contextos. É um trio que se entende na perfeição e que consegue ser viral no contágio com o público. A viagem, que esteve prestes a rebentar, fez escorrer muito suor não só nos corpos dos músicos, mas do público que não se mostrou passivo à explosão sónica, produzida pela força dos ritmos, grooves, pedais e outros elementos experimentais.
Os Fire! encerraram o concerto com um hit dos anos 90 e despediram-se com o conselho nada fácil: amem-se uns aos outros.
Texto: Priscilla FontouraImagens: Sophia Petra, Priscilla Fontoura
Local: Centro para os Assuntos da Arte e Arquitectura CAAA, Guimarães
Data: 6 de Outubro, 2018
Festival Mucho Flow