Não é fácil para um ocidental pronunciar o nome da banda japonesa. É um quanto engraçado quando o pronunciamos, mas, assim que o repetimos, entranha-se. As vozes dos asiáticos parecem saídas de um episódio anime, são frágeis e soam a algodão doce.
Os Kikagaku Moyo não se estreiam em Portugal, quem se lembra do SonicBlast Moledo do ano passado? Um número ecléctico de pessoas aguarda-os, desta vez, no auditório do renovado Café CCOP. Assim que chegam ao palco, não há barulho.
Este quinteto, de aparência tão exótica, consegue chegar a um som setentista com Masana Temples (2018) que "até mete impressão". Embora o concerto tenha começado com alguns problemas técnicos, conforme iam aquecendo, passou de problemático a perfeito. Se os juntássemos no mesmo cartaz com Grails, Secret Chiefs 3, Kayo Dot, Flower Travellin' Band (infelizmente inactivos), Zu, e tantas outras bandas que nos "levam daqui para fora", seria qual cálice sagrado que nos transporta para o mundo perfeito. Estas bandas não se enquadram nas fórmulas convencionais, além de encherem bem o ouvido, contêm espiritualidade que não precisa de palavras para ser interpretada.
O concerto começa contido e acaba em polifonia desconcertante. O baterista e mentor da banda, Go Kurosawa, numa performance quase meditativa, transita do início ao fim em linha crescente. O diálogo entre todos os instrumentos não coloca nenhum músico em destaque, conversa-se reciprocamente com pequenos apontamentos sonoros (chocalhos), que fazem com que a sensibilidade musical avance para outro nível.
Como responder a Tree Smoke (Kikagaku Moyo, 2013)? Ouvem-se gritos de agradecimento porque o tema consta no repertório. Quase nos convencemos de que quem está presente no concerto dos Kikugaku Moyo faz parte de uma comunidade exclusiva. Os japoneses de olhos rasgados não se distanciam de ninguém, olham-nos causando um efeito hipnótico. O baixo de Kotsu Guy que mete, de vez em quando, uns contratempos tímidos, marca o tempo para que as guitarras extrapolem. Obviamente que a cítara quitada de Ryu foge aos quadrantes do género rock, se bem que no rock psicadélico de sessenta e setenta alguns músicos, exemplo Jehtro Tull — deixando-se inebriar pela Índia e por todo o esoterismo inerente —, depositaram a transcendência psicadélica no rock adicionando instrumentos tradicionais do oriente; e o rock ocidental deixou de estar confinado aos limites de outrora, estabelecendo-se, assim, a ponte entre o ocidente e o oriente.
O tema Gatherings (Masana Temples, 2018) é um dos pontos altos da noite, as transições entre distorções altas, misturadas em oitavas a um ritmo que nos leva às viagens de estrada, causam no público a agitação das batidas como ondulações do mar. A cítara exerce todo o seu poder em Streets of Calcutta (Forest of Lost Children, 2014) e traz o cheiro do açafrão e traça o firmamento que separa o oriente do ocidente. Os nipónicos levam-nos a dar a volta ao mundo, paramos no Médio Oriente, de repente entramos no cenário de O Bom, o Mau e o Vilão, paramos, por momentos, num episódio anime, e, finalmente, na Índia alcançamos o nirvana.
Podia falar-se de samurais só porque são do Japão; no entanto, aqui não se procura vingança à lei da espada, pelo contrário, sente-se o amor filéo.
TEXTO e IMAGENS: Priscilla Fontoura
TEXTO e IMAGENS: Priscilla Fontoura
LOCAL: Café CCOP, Porto
DATA: 2 de Dezembro, 2018
CONCERTOS: Kikagaku Moyo
Promotora: Lovers & Lollypops
DATA: 2 de Dezembro, 2018
CONCERTOS: Kikagaku Moyo
Promotora: Lovers & Lollypops