11 - Deadline
12 - Samurai Cop
13 - Goke, bodysnatcher from Hell
14 - Cellar Dweller
Escrever ficção pode servir para exorcizar demónios, criar mundos bem mais interessantes do que aquele em que habitamos e/ou assegurar o leitor que não está sozinho por mais que a sua existência seja solitária ou permeada por desilusões. Dentro dos géneros da literatura, o terror sempre ofereceu uma visão do fantástico com as suas garras bem fincadas no pescoço do leitor, imergindo-o num ambiente tenso, desconfortável, mas que oferece uma boa dose de adrenalina e, por vezes, humor negro. Há quem considere o género mero sensacionalismo sem substância, ou uma exploração de mau gosto do sofrimento humano, no entanto, para algumas pessoas, a literatura de terror é a que mais se aproxima de uma transcrição artística dos medos, ânsias e desejos mais obscuros do nosso subconsciente. Este filme de 1984 realizado por Mario Azzopardi convida-nos a entrar no mundo de Steven Lassey (brilhantemente interpretado por Stephen Young), um escritor de livros e filmes de terror cujas imagens e temas transgressivos fazem com que seja vilipendiado por alguns críticos. Apesar do seu sucesso comercial, Steven começa a ser vítima de uma progressiva e surreal ruptura com a realidade ao mesmo tempo que batalha com um bloqueio criativo e problemas familiares. O filme tem uma estrutura intrigante de narrativa, havendo inserts de cenas de filmes que Steven escreveu, essas cenas são bizarras e violentas, mas possuem um certo charme surrealista. É um filme que nos convida a reflectir sobre a influência da violência no cinema, mas sem qualquer pingo de moralismo, repressão ou hipocrisia.
12 - Samurai Cop
De acordo com as minhas experiências cinematográficas, a maior parte dos filmes que tem como título qualquer coisa Cop (Wolf Cop, Maniac Cop, Robocop, Demon Cop, etc) são filmes que tenho a certeza de que vou gostar. Quando se junta Samurai à equação, além de ter a certeza que irei gostar, fico também com vontade de absorver algumas das linhas de diálogo do filme. Se eu fosse uma pessoa inclinada para oferecer parte do meu romantismo inato a um ser humano, provavelmente usaria esta linha de diálogo:
Jennifer: How did you know i'd come home with you?
Joe Marshall, the samurai cop: Let's just say... I can read eyes.
Além desta pérola de sensibilidade, o filme está cheio de trocas de diálogo memoráveis. O filme foi realizado por Amir Shervan, um realizador de origem iraniana que dedicou a sua carreira ao género de filmes de acção. A narrativa segue a odisseia de dois polícias, Joe e Frank que tentam travar as operações ilegais de um gang yakuza em Los Angeles. As cenas de luta têm uma coreografia um pouco bizarra e pouco convincente, mas a energia está toda lá! A banda sonora faz com que as músicas dos jogos spectrum assumam a carga emocional de uma ópera ou peça clássica e a maior parte dos diálogos foi dobrada em estúdio. A representação dos actores se parecer que foi gravada num só take, é porque realmente foi, mas o coração está lá! É uma boa peça de entretenimento que pode ser apreciada com um pack de cervejas e várias sandes de queijo.
Se se tem uma atracção por vampiros, discos voadores e bolhas esquisitas de origem extraterrestre, este filme japonês realizado por Hajime Satô talvez seja digno de atenção. A cinematografia do filme ajuda a criar uma atmosfera onírica e intrigante pelo uso de cores quentes, laranjas, amarelos e vermelhos. A cena inicial é memorável com um avião a planar por entre um céu ameaçador de cor vermelha que prenuncia uma invasão alienígena. A premissa subjacente do filme é que a humanidade caminha para a autodestruição pela sua incapacidade de viver em paz e harmonia. Um pensamento reconfortante para misantropos genuínos e/ou pessoas sensatas e clarividentes. A narrativa do filme segue um grupo de sobreviventes de um desastre de avião que nessa situação extrema de sobrevivência revela os seus verdadeiros respectivos caracteres. Uns são heróicos, outros são consumidos pela insanidade, psicoses e alguns revelam o que sempre foram, canalhas. Além desses dramas de psicologia humana, há também um humano possuído por entidades extraterrestres que se torna um vampiro assassino disposto a eliminar os sobreviventes um por um. Há também uma mensagem clara que se uma espécie extraterrestre eliminar a raça humana, a culpa é essencialmente dos humanos e da sua natureza corrompida. Como seria de esperar, o final do filme não nos deixa num cenário de unicórnios, arco-íris feitos de rebuçados e cogumelos gigantes brancos e vermelhos com caras sorridentes.
Para quem já passou mais de sete meses seguidos só a ler comics ou manga e inevitavelmente ficou desiludida quando numa interacção social não vê aparecer nenhum balão de diálogo quando a pessoa com quem estamos decide falar, este filme oferece algum conforto ao misturar a arte da banda desenhada com o cinema. Assim como no popular teledisco dos Ah-Ah em que um personagem desenhado ganha vida e tenta conquistar o coração da adolescente apaixonada, neste caso, também há essa magia, mas em vez de ser um músico galã e romântico é um monstro assassino. Este monstro foi desenhado por um cartoonista que através da sua criatividade febril acabou por dar vida à sua criação. O monstro e criador acabam por sucumbir, mas passado 30 anos, a criatura volta para reclamar mais vítimas. A narrativa segue então o caminho clássico de humanos contra forças demoníacas, mas o que realmente impressiona é a qualidade das ilustrações e o cuidado que foi investido no design da criatura. Apesar da sua curta duração, John Carl Buechler realizou um filme que mistura de forma divertida elementos de fantasia com o género de terror.
15 – The Refrigerator
Além da antropomorfização de animais para efeitos de sátira social, mensagens morais ou boas e complexas narrativas com bonecos fofinhos (como é o caso de uma das minhas séries de animação preferidas, My little Poney friendship is Magic), há também uma tendência em filmes de terror sejam eles de baixo-orçamento ou não para dotar objectos, frutos, legumes ou bonecos com instintos homicidas. Sejam eles camas (The bed that eats), bonecos (Child’s Play, Demonic Toys, o urso cor-de-rosa do Toy story 3, etc), pneus (Rubber), carros (Christine, etc), no caso deste filme realizado por Nicholas Jacobs, o objecto escolhido foi um frigorifico que é um portal para o inferno e está possuído por um demónio. Além de ser um pesadelo para pessoas que se encontram num regime de dieta austera, o frigorifico torna-se um perigo para basicamente toda a gente, especialmente para um jovem casal que se muda para um apartamento muito barato em Manhattan (já de si, um sinal de alerta, mas que em qualquer filme de terror é amplamente ignorado); e que é aterrorizado por um frigorifico diabólico que começa a exercer uma influência nefasta no simpático casal. A jovem começa a ter alucinações estranhas de laivos Lynchianos e rapidamente se convence que a culpa é do eletrodoméstico diabólico. Na sua luta contra essa força do mal, alia-se a Juan, um canalizador que por qualquer razão veste-se de cabedal e tem correntes. É o herói da narrativa, apesar de não fazer nada assumidamente heróico, sem ser avisar a jovem que o frigorifico é infernal e fazer uma dança de flamengo no meio da cozinha. Apesar do carácter ameaçador de um frigorífico possuído por forças demoníacas, o filme é claramente uma comédia com um elevado e bizarro sentido de humor, especialmente quando uma das personagens fala de forma estranhamente carnal sobre cozinhar salsichas. Há quem não meta canela nos pastéis de belém mas eu sou fã, assim como gosto de comédia no terror ou terror na comédia e este filme prova que quando há vontade de fazer algo diferente, os resultados podem ser maravilhosos. A tagline do filme é quase melhor que a do Alien (In space no one can hear you scream), sendo “There are no survivors, only leftovers”.
16 - Society
Sempre houve bastante curiosidade e especulação sobre os hábitos privados dos indivíduos dos altos escalões da sociedade. À superfície parece ser uma vida glamorosa de consumo de garrafas de champanhe (cujo preço varia entre metade ou a totalidade de um salário mínimo), trufas, o inevitável caviar e festas em iates. No entanto, há sempre uma suspeita que por debaixo das sensibilidades para produtos gourmet esconde-se uma realidade sinistra de traços ocultos. Como por exemplo, uma seita de pessoas sequiosas por poder que glorificam Mammon e são capazes de tudo para manter o seu lugar no topo. Este filme realizado por Brian Yuzna (que foi também a sua estreia), satiriza os costumes e hábitos da classe alta de Beverly Hills, transformando-a num grupo de pessoas que nada mais são que uma seita com costumes sexuais que poderiam irritar o Marquês de Sade porque não foi ele a escrevê-las. A narrativa segue um rapaz ingénuo, mas de bom coração chamado Billy que, apesar de ter nascido numa família de classe alta, nunca se sentiu bem aceite pelos seus pais. Durante o decorrer da história, o jovem começa a sentir que algo realmente não bate certo com os elementos da sua família e entra numa espiral de paranóia aflitiva que o leva a descobrir a verdadeira natureza dos seus familiares. As cenas finais do filme revelam em toda a sua perversão um ritual chamado “The Shunting” que é perturbante, estranhamente cómico, repelente e, acima de tudo, inesquecível. Os remakes podem não ser muito úteis ou pertinentes, mas este filme merecia certamente um ou então ainda mais projecção. Ao contrário dos outros filmes, não é aconselhável comer durante a sua visualização, especialmente durante os últimos 20 minutos.
17 - Hard rock zombies
Zombies e serial-killers são talvez os veículos mais usados para espalhar a carnificina nos filmes de terror. Há zombies que se mexem mais rápido que outros e há alguns que até se apaixonam, especialmente na fusão de filmes de zombies com comédias românticas que é um dos campos que ainda não está completamente saturado. Há muitos livros que também nos explicam como agir e o que fazer para sobreviver a um zombie apocalipse. Manuais que muitos consideram humorísticos e inúteis, mas que talvez façam sentido no dia em que a segunda circular ou a IC 19 fiquem pejadas de carros com portas abertas e o asfalto cheio de poças e pegadas de sangue fresco. Apesar de toda a euforia criada por estes mortos-vivos que começou por volta dos anos 70, e que continua presente nos dias de hoje, há muitos filmes que são uma autêntica perda de tempo por repetirem a mesma fórmula de sempre e mostrarem que morder e arrancar um pedaço de carne a um humano é tão simples e rápido quanto trincar um marshmallow. Apesar deste filme realizado por Krishna Shah se apoiar na palavra Zombies no título, para provavelmente aproveitar a popularidade destas criaturas que tanto fascinam, o filme é bastante mais do que isso. É basicamente uma fusão de filme musical com Zombies e eis a verdadeira razão pela qual vi este filme. O verdadeiro elemento de terror é a música presente no filme tocada por uma banda supostamente de heavy-metal chamada Holy Moses. Digo supostamente porque não é heavy-metal nem tão pouco hard-rock. É um pouco como uma banda que aprendeu a tocar covers de Bon Jovi numa garagem qualquer. No entanto, seguimos as desventuras dos membros da banda que ficam alojados numa mansão com o Hitler, a Eva Braun (que é também uma lobisomem ou lobimulher neste caso) e dois anões. Claro que os instintos psicopáticos e homicidas do ditador de origem austríaca continuam bem presentes e mata os nossos heróis que acabam por regressar triunfantes em forma de Zombies para exercerem a sua vingança. Acho que uma das razões pela qual escrevo sobre este filme é a cena em que uma das raparigas pega na cabeça decapitada do namorado e pergunta se ele está okay. Um argumentista que escreve uma linha de diálogo dessas merece uma vénia e sobreviver a um zombie apocalipse. Não posso de boa fé recomendar este filme a toda a gente, apenas aqueles fãs de cinema que gostam da mistura de comédia (má) com terror ainda pior.
18 - Rock ‘n’ roll Nightmare
Agora já sei a resposta à aquela afamada pergunta “Qual foi a coisa mais perturbante e chocante que viste num filme?” Por mais que custe não vou mencionar a cena do extintor no Irreversível, a cena dos pontapés na barriga do Seul contre tous (também do Gaspar Noé), a cena das histórias da cortesã no Salò do Pasolini, as cenas de tortura do Martyrs ou outras coisas mais. Não, o mais perturbante são mesmo as cenas de sexo que este filme contém, especialmente uma passada num chuveiro que para além de durar imenso tempo, a maneira como as cenas estão montadas, dá a entender que passaram décadas na banheira. Também não entendi os constantes inserts do chuveiro a jorrar água durante essa cena, mas tudo bem. Assim como o filme anterior, tenho uma tendência algo masoquista para ver filmes de baixo-orçamento que envolvem bandas de música péssima cujos elementos são as personagens principais. No entanto, transparece que fizeram este filme com dedicação e que foi feito por pessoas amigas umas das outras, o que dá uma sensação subtil de conforto…por mais estranho que isso pareça. A verdadeira estrela do filme é John-Mikl Thor que garantiu um bom veículo cinematográfico para mostrar o seu físico imponente de guerreiro bárbaro, mas com um bom coração. Os vilões da história são pequenos monstros de aspecto estranho, incluindo um pedaço de frango frito com olhos (na realidade, é por causa dessas coisas que vejo este tipo de filmes), e claro, nem mais nem menos que Satanás com um look bastante particular. Cabe ao nosso herói de cabelos longos lisos sedosos e com franja, derrotar o príncipe das trevas durante cenas que parecem intermináveis e filmadas com enquadramentos e ângulos arrojados. O bem vence, vence sempre e o filme acaba, mas a cena do chuveiro, infelizmente, ficará sempre presente naquela área do cérebro que contém as coisas que queremos esquecer. Quem acha que a cena do Psycho do chuveiro é a coisa mais assustadora que já viu, precisa de ver este filme (ou não). John-Mikl Thor lançou discos e tocou como baixista numa banda chamada Iron Falcon, que por acaso, acho que é um nome épico. Este filme é para pessoas que apreciam música que tenta ser pesada mas que não é bem, pessoas que querem ver Satanás a ser estrangulado repetidamente, pessoas que gostam de pequenos monstros feitos de borracha, pessoas que gostam de estrelas do mar e finalmente, pessoas que se querem divertir e que não têm expectativas baixas porque as eliminaram completamente. Este filme canadiano realizado por John Fasano mostra um lado divertido dos anos 80, a década em que um homem podia ter cabelo longo com franja, mas podia ser durão na mesma.
19 - Brain Damage
Quem pensa que por se ter um baixo-orçamento não é possível fazer alegorias visuais de temas difíceis e profundos tais como dependência de drogas, desejos incontroláveis e manipulação precisa de ver este filme realizado por Frank Henenlotter (também responsável pelo excelente Basket Case). A narrativa apresenta-nos Brian, um jovem que passa a maior parte do tempo no seu quarto por estar deprimido e entediado. Esse estado de espírito muda abruptamente quando conhece Elmer, um parasita com voz suave e de timbre coloquial que possui o jovem injectando-lhe no cérebro uma substância líquida que causa profundo bem-estar e visões. A partir daí, instala-se o caos e a carnificina porque em troca do precioso líquido, Elmer exige apenas uma coisa: miolos…de humanos, claro. Consumido pelo desejo irracional de ficar sob a influência da substância, Brian torna-se o escravo de Elmer na sua busca incessante por mais alimento. As sequências de alucinação são extremamente bem feitas e os dilemas interiores que começam a atormentar o jovem, são exteriorizados nas suas dificuldades de relacionamento com os que o rodeiam e na forma como a sua vida se deteriora por causa do vício. O humor é intenso, negro e retorcido mas a mensagem é clara, mostrando graficamente e sem pudores, as consequências devastadoras do uso de certas substâncias.
(CONTINUA...)
TEXTO: CLÁUDIA ZAFRE
IMAGENS: Cartazes dos filmes (Imdb)