Imagem por  Luísa Velez / Deus me Livro Foi num silêncio expectante que o auditório do CCB (Centro Cultural de Belém, ...

Sarah McCoy: lições de vida, aprendizagens, ritos de passagem numa nova voz que ao piano exala blues e soul

         Imagem por Luísa Velez / Deus me Livro

Foi num silêncio expectante que o auditório do CCB (Centro Cultural de Belém, Lisboa) acolheu a entrada em palco de Sarah McCoy que, sob uma torrente de aplausos, se sentou diante de um elegante piano de cauda robusto. O seu eterno aliado na composição de temas que, além de serem vinhetas das suas experiências e pensamentos, são também o reflexo de uma compositora destemida e sem problemas em criar uma forte comunicação com o público para o qual toca. 

A relação de intimidade que cria com a sua audiência, recai bastante na sua capacidade de comunicação “sem-filtros” em monólogos que inicia entre os temas, onde explica a génese da música que irá tocar ou discorre sobre características da sua personalidade, como por exemplo, a franqueza com que admite que quando se apaixona, se torna um bocado “creepy”, mas que está a resolver esse assunto com a sua terapeuta. Confissões que assumem um lado tanto humorístico como de sinceridade, e que são interlúdios de descontracção e de alguma luminosidade para temas que, por vezes, assumem contornos intensos e negros.

             Imagem por Luísa Velez / Deus me Livro

A compositora/intérprete iniciou grande parte da sua carreira a tocar em bares em Nova Orleães e na boémia Paris, absorvendo experiências e vivências que lhe permitiram gravar o seu disco de estreia, Blood Siren, editado a 25 de janeiro deste ano pela Blue Note, com a produção de Renaud Letang e Chilly Gonzales.

Blood Siren é o fruto maduro de anos passados em viagens, aventuras e peripécias da cantora que percorreu várias cidades dos Estados Unidos, vivendo como squatter ou em caravanas, fazendo trabalhos de sobrevivência, enquanto tocava em bares e aperfeiçoava as suas canções.

Os jogos de luzes de Benjamin Durocher fizeram com que o palco se envolvesse num azul aveludado para os acordes melancólicos de Boogieman. A voz recheada de blues e soul de Sarah McCoy acompanhou na perfeição as notas fantasmagóricas da canção. A sua voz e o piano tornaram-se indistinguíveis na penumbra que, por vezes, assolava o palco, fazendo uma única e nova criatura. O piano, como instrumento não só de expressão, mas de sobrevivência, foi, a par de uma guitarra, a salvação de Sarah durante a juventude após os falecimentos dos seus pai e avó.

I Miss Her, é um tema que Sarah explicou tratar-se das saudades que tem do seu “eu” mais imprevisível e inconsequente, o seu “eu” que, apetecendo-lhe, fá-la dançar à chuva — dançará sem pensar nas consequências de um possível resfriado. Sarah não teve pejo em partilhar com o seu público, as razões por trás das várias canções que tocou, como Mamma's Song que se trata de certos sentimentos e pensamentos que quis partilhar com a sua mãe e, em vez de escrever uma carta, compôs uma canção que lhe tocou e cantou.

A exuberância de Sarah em palco, com o seu registo por vezes cómico, baseado numa auto-análise acérrima e constante, harmoniza-se com o registo soturno, tanto de delicado quanto de intenso do seu repertório musical. Sarah tocou vários temas do seu disco de estreia e mais algumas surpresas, como outros dois originais seus, Between the Lines e Creep.

O concerto terminou com um encore, com Sarah a regressar por trás da cortina ao som das palmas de um público que queria ser embalado mais um pouco pelo seu blues e soul. 

A sua viagem pelos palcos portugueses continuará nas seguintes datas: 31 de Outubro no Teatro Municipal na Guarda, 1 de Novembro no Teatro Sá da Bandeira em Santarém e, por fim, 2 de Novembro no Theatro Circo em Braga.

- TRANSLATION - 

A silence that exuded anticipation permeated the auditorium CCB (Centro Cultural de Belém, Lisbon) that welcomed Sarah McCoy, who under a stream of applause sat behind an elegant classic piano. Her eternal ally in composing songs that besides being vignettes of her own experiences and thoughts, are also the reflection of a fearless musician who has no problems creating a bond and a strong communication with her audience. 

The intimate relationship she creates with the audience, is based primarily on her ability to speak "without filters" in monologues that are placed at the end and beginning of each song, in which Sarah explains the genesis for a certain song, or speaks candidly about certain aspects of her personality, like for instance, the frankness with which she admits that when she falls in love, she tends to get a bit "creepy" but she is solving that issue with her therapist. Confessions that tend to levitate between the humorous and the more emotional side and that tend to become relaxed and "light" interludes between the songs that can assume an intense and darker side. 

                                                  Picture by Luísa Velez / Deus me Livro                                          

The composer/singer played in bars in New Orleans and bohemian Paris during her early career, absorbing life experiences that inspired her to write her debut record, Blood Siren, released at 25th of January this year by the label Blue Note and produced by Renaud Letang and Chilly Gonzales

Blood Siren is the mature fruit that rose from years of traveling, adventuring and surviving from a singer that travelled through various cities in the USA, living in squatted buildings or in vans, while playing in bars and perfecting her songs. 

The stage lights by Benjamin Durocher turned the stage a velvet blue for the melancholic chords of Boogieman. Sarah McCoy's voice filled with soul and blues accompanied to perfection the ghostly notes of the song. Her voice and the piano became one entity in the gloom that sometimes surrounded all of the stage. The piano, as an instrument not only of expression but of survival, for it was the piano and the guitar that helped Sarah during her youth when she mourned the loss of her father and grandmother.

                                                                                Picture by Luísa Velez / Deus me Livro 

I Miss Her, is a song that Sarah explained to be about missing her younger "self", one that was more unpredictable, a "self" that if it felt like to dance in the rain, she would dance in the rain, oblivious to anything else. Sarah was not reticent to share with her audience some backstories for the songs she played, like Mamma's Song that deals with certain feelings and thoughts she wanted to show her mother, and instead of writing a letter, she composed and played that song her. 

Sarah's exuberance on stage, with her humorous side, based on a straight self-analysis, harmonizes with the gloomy, delicate and intense qualities of her songs. Sarah played several songs from Blood Siren as well as some surprises, like Between the Lines and Creep

The concert ended with an encore, with Sarah returning from behind the curtain at the sound of clapping from an audience that wanted to continue to be swayed by her blues and soul.

Her voyage through portuguese stages will continue on the 31th October in Teatro Municipal da Guarda, 1st of November on Teatro Sá da Bandeira in Santarém and lastly, at 2nd Novembre in Theatro Circo in Braga.


Texto: Cláudia Zafre
Imagem: © Luísa Velez / Deus me Livro 
Concertos: Sarah McCoy
Data: 27 de Outubro de 2019
Locais: CCB (Centro Cultural de Belém), Lisboa
Divulgação: Sara Does PR
Produção: João Vaz Silva