Luiz Amaro é um músico natural de São Paulo. O seu percurso no mundo criativo é variado e bastante ligado à arte de contar histórias, sejam...

Luiz Amaro: Narrativas sonoras em clima pandémico





Luiz Amaro é um músico natural de São Paulo. O seu percurso no mundo criativo é variado e bastante ligado à arte de contar histórias, sejam elas através de canções ou de outros meios. Luiz grava e produz em casa, o que de certa forma traduz o habitat natural de quem constrói personagens para dar azo a narrativas sonoras assentes em influências que vão desde o MPB e Bossa Nova. 

As suas influências são diversas e aventureiras. O músico lançou alguns temas gravados no seu estúdio caseiro e planeia o lançamento de outros registos num futuro breve. 

Luiz, descreves-te como um semi-músico, talvez por te dedicares a outras actividades artísticas além da música. Fala-nos um pouco do teu percurso artístico até aos dias de hoje. 
Meu percurso artístico é um pouco errático. Costumo dizer que sou semi-músico porque, além de realizar outras actividades e me interessar por outros campos artísticos, não sinto que sou um músico convencional. Não sou como aqueles que vivem fazendo shows, sabem muita teoria musical e são instrumentistas virtuosos. Sei o suficiente para compor e registar algumas canções. 

Eu sempre ouvi muita música. Costumava decorar todas as letras dos meus álbuns preferidos. Mas comecei a tocar um pouco tarde. Antes disso, me interessava mais por escrita, desenho, videogame e cinema. Eu queria ser cineasta até os 16 anos, foi quando comecei a tocar violão e a música me fisgou. Toquei em algumas bandas, trabalhei por uns meses em um estúdio, fiz um curso de produção fonográfica. Em paralelo a isso, fiz uma graduação em publicidade e tentei explorar a universidade ao máximo: fiz aulas de canto coral, teatro, cinema, dança, fotografia. Como compositor, às vezes me sinto mais influenciado por essas outras áreas do que pela própria música. 

Como é que tens sentido o impacto da pandemia e como é que ela tem contribuído para a tua produção criativa? 
Eu sempre gravei principalmente em casa, então nesse sentido a pandemia não me afectou muito. Em termos de motivação, há altos e baixos. No início da pandemia compus e toquei bastante, depois parei um pouco, voltei, parei de novo. Acho que a contribuição desse período foi ter mais tempo para organizar um conjunto de canções novas e antigas e decidir o que vale a pena ser gravado e produzido. 

Gravas os teus temas de forma caseira num home-studio e as colaborações com outros músicos são feitas à distância. De que forma é que esse tipo de produção se adequa às tuas necessidades? Já pensaste gravar em estúdio? 
Gravo em casa pela conveniência e flexibilidade. Gosto de gravar nos meus próprios horários. Não tenho equipamentos muito bons, então seria inútil tentar se aproximar de uma qualidade de estúdio. Meu objectivo é extrair o que consigo da minha situação e registar as músicas de uma forma inteligível e interessante. 

Uma coisa nova que aconteceu durante pandemia foi justamente a colaboração à distância. Nunca tinha feito isso antes e gostei muito. É algo que pretendo manter. Adoraria gravar com pessoas de outras cidades ou países, por exemplo. 

Eu já gravei algumas coisas minhas em estúdio quando fiz o curso de produção fonográfica. Não gostei muito do resultado. Mas pretendo voltar a gravar em estúdio assim que tiver a oportunidade. Estava planeando para fazer isso neste ano, mas tive que adiar. Quero experimentar um processo híbrido, gravando algumas partes em casa e outras em estúdio. 


Com que idade é que começaste a tocar guitarra e que temas te lembras que foram os primeiros que aprendeste a tocar? 
Meu percurso com o violão/guitarra também é errático. Aos 12 anos, meus pais me colocaram para fazer aulas de violão clássico para eu sair um pouco do videogame. Mas não deu muito certo, eu preferia jogar. Alguns anos mais tarde, o violão estava parado em casa e eu resolvi pegá-lo. Entrei na internet para aprender alguma coisa. Acho que foi o riff de Wish You Were Here, do Pink Floyd. Fiquei dias tentando tocar aquelas notas, com o violão velho e desafinado. Aí comecei a gostar e fui aprendendo músicas pela internet, pegando dicas com outras pessoas que tocavam, começando a tirar algumas coisas simples de ouvido. Sou autodidacta, embora não concorde muito com o termo. Acho que o autodidacta é apenas alguém que aprende com muitos professores informais e sem um estudo metódico. Não se aprende nada sozinho. 

Como é que foi o processo de composição do tema Mário Coveiro? 
Um dia ouvi mais uma das frases ''geniais'' do presidente Bolsonaro que, quando questionado sobre as mortes por COVID, respondeu: ''E daí? Não sou coveiro''. Fiquei pensando como deveria ser a vida de um coveiro durante uma pandemia como essa. Pesquisei um pouco, vi entrevistas com coveiros, vi fotografias de cemitérios cheios de covas improvisadas para vítimas de COVID. Eu sempre gostei de músicas narrativas e sobre personagens, pensei que esse seria um bom tema. Então criei o personagem, fiz um trocadilho com o nome de Mário Covas, um falecido político brasileiro. Escrevi a letra e a melodia e depois harmonizei no violão. Fui construindo o arranjo aos poucos, com ajuda à distância de Victor Veronesi (que gravou piano e vocais de apoio), Felipe Zular (que compôs e gravou as linhas de Sax) e Júlia Meireles (que também gravou vocais de apoio). 

Imagem por Mariana Fortes 

Para quando o lançamento de um EP? Tens algo planeado? 
Pretendo lançar mais um single, acompanhado de um clipe, ainda neste ano. Estou gravando bastante e preparando um conjunto de canções para janeiro de 2021. Ainda não sei se será um EP ou um álbum. Mas será alguma coisa.

Texto e entrevista: Cláudia Zafre
Entrevistado: Luiz Amaro