Imagem por Janaína Doca |
Elizabeth Mennezes é uma cantautora de Vale do Paraíba (Brasil) e a nova aposta da jovem editora brasileira Bangue Records. As líricas de Elizabeth reflectem as suas raízes e sensibilidade musical apoiada numa vertente forte LGBTQI+.
"Dita Benedita" é o seu single de estreia e no qual tradição, cultura ancestral, raízes e modernidade encontram a sua confluência.
Dividida entre a música e estudos superiores em arquitectura, Elizabeth prepara o seu disco de estreia "Beiral" sob o selo da editora Bangue Records.
Elizabeth, fala-nos um pouco de como iniciaste o teu percurso na música.
O caminho da música se apresentou muito genuinamente. Fui um criança muito curiosa, estava ligada em tudo. Penso que é importante fazer alguns recortes sobre esse acesso, que teve início na minha primeira infância, dentro desse código cristão protestante muito comum no Brasil, ainda num período bastante tradicional onde bater palmas era terminantemente proibido, e os instrumentos não melodiosos eram demonizados.
Sempre estive muito inteirada nos corais, e ali passo a apaixonar-me pelas harmonias, sobretudo as dissonantes. Em contrapartida, os instrumentos sempre me acompanharam, havia essa curiosidade de compreender de que forma eles “funcionavam”, quais eram os dialectos e idiomas daquele objecto nada inanimado. Essas pesquisas passaram a ser constantes e de forma natural, tanto dos instrumentos isoladamente, quanto das cordas vocais também enquanto instrumento.
Como vês e sentes a situação política e social no Brasil nos dias de hoje?
Estamos vivendo um pedaço caótico e reação no Brasil. O clima é de muita apreensão. Há uma desestrutura em todas as áreas. Temos no poder um presidente racista, homofóbico, transfóbico, aficionado por Trump e pelo modelo norte-americano, mimado e assassino, que pouco se importa com as políticas públicas básicas da população. A bancada evangélica também é um pavor e atropela o artigo 19 da Constituição que nos assegura a laicidade do Estado.
Quanto à saúde, não sabemos sobre como será o nosso acesso à vacina, se teremos vacina a tempo. O presidente foi o maior assinante dos atestados de óbito desse país. Estamos de luto!
Quem mandou matar Marielle Franco?
Quais foram as temáticas que mais quiseste explorar nas líricas de Dita Benedita?
Dita Benedita é uma dança. Nela eu trago a minha ancestralidade na letra, no canto e no toque do tambor. O Jongo – toque e dança afro brasileira, é muito presente, tocado não só com os atabaques, mas também com o violoncelo. Trago o Jazz quase que como um respiro, um arremate nessa costura. Gosto da ideia de colocar ritmos de escolas diferentes, que é o caso do violoncelo que está cumprindo um papel percursivo e ao mesmo tempo puro da música clássica.
Além da música, que outras vertentes artísticas gostas de explorar?
Sou graduada em Arquitectura e Urbanismo (FAU-TAU), trabalho com cerâmica, faço produção de desenhos botânicos, e não só...
Creio que tudo isso, hoje, também é música. Cada vez mais tenho conseguido transitar por esses espaços de forma mais fluida e sem muita dor. Como se eu pudesse fazer só uma vertente artística e deixar outra de lado. Não. Acho isso muito colonial. Posso ser e sou muitas!
O que é que podes adiantar sobre o teu disco de estreia?
Beiral é um álbum-ritual de 13 faixas. Gosto de utilizar essa terminologia por falar directamente da minha ancestralidade e outras subjectividades. Não sei se quero, em termos rítmicos, delimitar por onde passa, se pelo samba-jazz, se pela bossa, penso que cada um pode inventar pra si onde Beiral te acessa. É um álbum com começo, meio e fim, que conta uma história, que se amarra no palco. E, espero em Exú que seja logo!
Texto e entrevista : Cláudia Zafre
Entrevistada: Elizabeth Mennezes