Dando continuidade ao artigo sobre as séries memoráveis com genéricos à altura, é dado seguimento com esta segunda parte em que são apresent...

Recordar é viver: de olhos fechados sabemos de cor e salteado as séries só de ouvir o tema do genérico. Seinfeld, Simpsons, Esquadrão Classe A, Alf, Adultos à Força, X-Files fazem parte do bolo de uma época (Parte 2)

Dando continuidade ao artigo sobre as séries memoráveis com genéricos à altura, é dado seguimento com esta segunda parte em que são apresentados mais exemplos.

Cartaz Seinfeld

Seinfeld - tema de Jonathan Wolffsérie co-criada Jerry Seinfeld e Larry David
Quem se lembra do baixo slap do genérico de uma das séries mais inolvidáveis de sempre? Pois, se calhar muitos ainda não sabem, e talvez venha quebrar um pouco a magia à volta do tema do genérico de Seinfeld, mas quem julgaria que em vez de um baixo seria um órgão a dar aquele vigor groovy ao genérico tão simples e pensado na mouche? O tema da sitcom foi criado por Jonathan Wolff, o mesmo autor já referido e que também criou o tema do genérico de Saved By the Bell. Ao estilo Frank Zappa, Jonathan afirma que usou o baixo slap como uma espécie de melodia primária para a série co-criada e co-escrita por Jerry Seinfeld e Larry David. Há que ressaltar que os episódios contam também com a colaboração de outros argumentistas convidados. Segundo o compositor, a faixa de áudio não interfere com as intervenções de stand-up de Jerry e permite-lhe utilizá-la modularmente para incluir antes ou depois das mesmas, se fosse algo mais preenchido e encorpado iria, muito provavelmente, distrair o espectador do propósito principal que passa por estar atento à narrativa do protagonista. 

 

Seinfeld trouxe ao mundo da comédia e das séries um revigorante mundo novo, cujo enredo lida bem com as estranhezas surreais que podem acontecer na rotina de qualquer um. A série passa-se em Manhattan, no Upper West Side (na realidade foi filmada em LA), onde habitam quatro amigos, Jerry Seinfeld, George Constanza, Elaine Benes e Cosmo Kramer - cada um com uma identidade muito singular, uns a dominar o humor intelectual e outros o físico. Ao longo das nove temporadas, vão sendo introduzidos os parentes dos protagonistas. Seinfeld bebe muito do humor judaico entrelaçado com o humor convencional. Tornou-se um sucesso comercial e um fenómeno até cultural. A série foi exibida em Portugal na TVI em 1998.

       

A revista Time estimou em 1978 que 80% dos humoristas americanos profissionais seriam judeus. Anteriormente, já Sigmund Freud considerara o humor judaico peculiar, uma vez que, segundo plasmado no seu livro Chistes e a sua Relação com o Inconsciente, entendeu o humor judaico como um estilo derivado da troça que se faz de dentro para dentro e de dentro para fora, ou seja, as piadas são feitas dentro do grupo e não acerca do "outro" ou do "goyim"; em vez de se confinar ao sentido autodepreciativo, contém também um elemento dialético de auto-elogio em contraposição à simplória autodepreciação que torna o humor medíocre e suportado em preconceitos. Um dos expoentes máximos que servem de exemplo do que pode ser entendido como humor judaico é a Enciclopédia do Humor Judaico, de Henry D. Spalding.

Cartaz Simpsons

Simpsons - tema de Danny Elfman, série Simpsons criada Matt Groening
O saxofone de Lisa é o que nos fica no ouvido quando pensamos no genérico de Simpsons e todos os detalhes preenchidos por uma Big Band. Metais, metais e mais metais. Numa altura em que as séries andavam muito à volta do "real", as animações para adultos começaram cada vez mais a fazer parte da programação televisiva norte-americana. O tema do genérico sincroniza-se com a cortina da nuvem baixa (estrato) que se abre para introduzir aos espectadores a família Simpson. Musicalmente o genérico é acompanhado por um sintetizador com efeito chorus que só começa a tocar segundos antes do crescendo no momento em que a nuvem começa a separar-se, seguido do texto a amarelo The Simpsons - o mesmo texto utilizado na segunda temporada. 

Simpsons é cantado de uma maneira angelical (NOTA: A versão do tema na Primeira Temporada, arranjada por Danny Elfman, era um pouco mais grosseira e mais staccato, por falta de um termo mais descritivo, do que a versão usada posteriormente). A nuvem desaparece de ambos os lados, à medida que o texto se aproxima mais, e a câmara move-se através da letra "P" para uma visão panorâmica de Springfield. Sobrevoa-se a Central Nuclear da cidade, o Depósito de Pneus, desce-se lentamente a rua, enquanto passa-se pelo dentista em direcção à escola primária de Springfield. O som que se inicia angélico passa a dinâmico — assim é introduzido cada membro da família Simpson e os lugares identitários onde acontece a série, transita-se para a aula de música onde aparecem os colegas de Lisa a tocar vários instrumentos e a protagonista com o seu saxofone reflectindo a sua imersão musical. O tema jazzy remete para uma big band dinâmica que retrata uma família muitas vezes metida em apuros por causa do progenitor Homer Simpson.
A Big Band da Nazaré tem uma versão muito interessante sob a batuta de Adelino Mota


No que respeita ao enredo, a sitcom animada criada por Matt Groening desenha de um modo satírico o estilo de vida de uma família de classe média protagonizada por Homer, MargeBart, Lisa e Maggie na cidade de Springfield — a família serve de analogia para a cultura e sociedade norte-americanas, o auge dos programas de TV e o consequente vício, como também os vários aspectos da condição humana. A série foi criada a pedido do produtor James L. Brooks e que originalmente seria uma encomenda para uma série de curtas de animação. Groening concebeu uma família disfuncional e partiu da sua própria experiência pessoal para criar personagens que são reflexo da sua família, sendo que Bart é o seu alter ego. Como a estreia da primeira temporada foi um especial de Natal, a primeira versão do genérico foi transmitido no segundo episódio, "Bart the Genius", mais rudemente animada (parecido com a animação usada nos episódios da primeira temporada) do que a segunda temporada em diante que foi inteiramente elaborada por Kevin Petrilak

Consta que a série teve a sua estreia a 17 de Dezembro de 1989 e está entre as mais populares da televisão. Mais de 10.000 episódios foram exibidos e é uma das séries dos EUA transmitida em horário nobre há mais tempo, superando em Fevereiro de 2012 Gunsmoke.

Cartaz Esquadrão Classe A

Esquadrão Classe A / The A-Team, composto por Mike Post e Pete Carpenter, série co-criada Frank Lupo e Stephen J. Cannell
Nos anos 80 e 90 muitos filmes foram inspirados pelo acontecimento da guerra do Vietname para explorarem temáticas como espionagem, operações especiais e missões que reflectem os traumas causados durante a guerra. A sinopse de A-Team esboça quatro veteranos da guerra do Vietname acusados por um crime que não cometeram e encontram-se numa fase em que não conseguem mais provar a sua inocência, uma vez que os verdadeiros culpados estão mortos. Motivados pela condenação injusta e pelo encarceramento, resolvem escapar da prisão de segurança máxima e fugir para Los Angeles para viverem como justiceiros e ajudar pessoas que precisam de protecção. À imagem de Macgyver, o tema do genérico de Esquadrão Classe A composto por Mike Post e Pete Carpenter inspira à resolução do problema que é solucionado pelo esquadrão.


Alf, tema composto por Alf Clausen, série co-criada por Paul Fusco, Tom Patchett
O ambiente familiar e envolvente do tema do genérico de Alf, esse ser extraterrestre, não poderia ser mais nostálgico. Enquanto vários temas apresentados nos genéricos das séries da década de 80 eram vocalizados, o tema escolhido para Alf não caiu nos padrões anteriores e foi composto apenas para ser instrumental, soando jazzy tal como Seinfeld. Curiosamente o tema foi composto também por alguém chamado Alf, mas com outro apelido, Alf Clausen. O músico iniciou a sua carreia com um pé em Hollywood com The Partridge Family. Com formação em arranjo e composição na tão conhecida Berklee, Clausen trabalhou como copista de partituras. Nos idos anos 70, o compositor trabalhou em vários programas televisivos. 

 

Não é aleatório o facto do tema de Alf ser tão jazzy, se soubermos que Clausen aprendeu a tocar baixo durante a sua adolescência. Assim que Alf encerrou a sua produção, Clausen passou meses sem trabalho e, nessa fase, foi surpreendido com um telefonema de um produtor de Simpsons que estaria à procura de um compositor para a série. Matt Groening expôs a ideia de Simpsons descrevendo-a da seguinte maneira: "Não consideramos um desenho animado, mas um drama onde os personagens são desenhados, e gostaríamos que fosse marcado dessa maneira. Podes fazer isso?". O seu primeiro episódio foi "The Simpsons Treehouse of Horror I", da segunda temporada. Clausen teria sido aprovado e tornou-se compositor de Simpsons. Alf, o próprio alienígena, apareceu algumas vezes n'Os Simpsons também. Seriam apenas e provavelmente referências engraçadas da cultura pop, mas é igualmente engraçado pensar que seriam referências internas ao compositor também.

Cartaz Adultos à Força

Adultos à Força - The Party of Five, tema BoDeans, série co-criada por Christopher Keyser e Amy Lippman
Nem todas as séries faziam-se de explosões, libertação de reféns com final feliz, os anos 80 e 90 também retratavam temáticas mais dramáticas que reflectiam os problemas vulgares da sociedade. Nesse sentido, Adultos à Força - Party of Five - tinha como enredo cinco irmãos órfãos que tinham de se ajudar mutuamente para resistirem aos problemas da vida sem suporte parental, perda que resultou de um acidente de viação. A série acontece em São Francisco e tem como elenco Charlie (Matthew Fox), o irmão mais velho, mulherengo e imaturo que é obrigado a assumir a responsabilidade por se ter tornado o novo chefe da família, Bailey (Scott Wolf), o adolescente rebelde forçado a assumir o papel responsável e levado pela frustração é consumidor de álcool; Julia (Neve Campbell), uma adolescente sensível que mais tarde lida com uma relação de violência doméstica, a prodigiosa e talentosa músico Claudia (Lacey Chabert), e o bebé Owen que fica ao cuidado dos irmãos.


O tema dos BoDeans do álbum Go Slown Down, lançado em 1993, foi escolhido para o genérico da série, e cuja lírica inspira ao sentido de ajuda colectiva e recíproca. Nem sempre os temas dos genéricos seriam uma encomenda para trazer uma identidade própria aos mesmos, adaptações ou inclusões seriam outra estratégia. 

Cartaz X-Files

X Files - tema criado por Mark Snow, série criada por Chris Carter
Nos anos 90 fomos surpreendidos por esta série de ficção científica criada por Chris Carter e tinha como protagonista o casal Fox Mulder (David Duchovny) e Dana Scully (Gillian Leigh Anderson) para desvendar os mistérios e fenómenos mais surreais alguma vez imaginados. Uma mistura da estranheza de Twin Peaks, d'O Bom, O Mau e O Vilão de Enio Morricone com o lado mais plástico de Carpenter, é quase a fórmula do tema deste genérico composto por Mark Snow que incluiu o "echo effect" por acidente e sem saber tinha criado a identidade certa para o tema do genérico. O compositor sentiu que faltava algo para o tema e por casualidade Snow, motivado pela frustração, tocou no órgão e foi assim que surgiu o efeito que trouxe a estranheza necessária para o tema de X Files. A melodia do assobio surge de uma amostra antiga da linha Proteus de produtos de sintetizadores chamada "Whistling Joe" e foi gravado com o assobio da esposa de Snow, Glynn.

 

Conclusão:
Mais séries ficaram por referir: The Young Riders, Dinosaurs, Highlander, Tartarugas Ninja, e tantas outras. Nos anos 80 e 90 fomos introduzidos a muitas séries com genéricos tão importantes quanto os conteúdos que dali viriam. Hoje, de olhos fechados, sabemos de cor e salteado as séries só de ouvir o tema do genérico. O que a nostalgia tem de interessante é que o que é bom perdura no tempo, pois leva a revisitar lugares e imaginários que não serão esquecidos. Hoje, sente-se esse revivalismo no ar, com bandas, séries e filmes que se inspiram nessas décadas. Assim se molda o tempo e enaltece-se este sentido de pertença.

Texto: Priscilla Fontoura