Uma vez, em 1980, já estava eu nos GNR, fui passear com o meu amigo Rui Branco; entrámos – fumadíssimos – no Centro Comercial Brasília; ao passarmos numa loja de brincos e jóias, resolvi – tal era a pedra – furar a orelha esquerda; entrei, e as empregadas e todas as mulheres presentes, ficaram a olhar para mim; umas, só por eu ser homem e outras por me reconhecerem dos GNR; foi um burburinho; veio uma empregada e perguntou-me o que eu queria; eu disse que queria furar a orelha; e se demorava muito; ela respondeu que era um instantinho. Imaginava-me eu a entrar numa sala, a deitar-me e a vir uma enfermeira com luvas, a darem-me uma anestesia, para eu não sentir o alfinete que me furaria as orelhas; quando ela – afinal –, me aparece com uma caneta de feltro e um agrafador (ou tinha aspecto disso); pergunta-me qual a orelha, eu digo-lhe que quero na esquerda; ela marca-me na orelha um "X" no sítio onde iria ser feito o furo; mete a minha orelha no meio do suposto agrafador e... PIMBA!!! Só senti uma picadita, nada de grave; o pior veio a seguir; o agrafador ficou preso à minha orelha; e ela dizia: "Nunca me aconteceu isto" ou "Tenha calma"; e, de repente, tenho um agrafador na orelha, o meu amigo a cagar-se a rir, todas as clientes a olhar para mim, e as empregadas todas à minha volta; aí, a ganza começa a bater, e começa a dar-me uma queda de tensão; vejo-as todas à minha volta a falar ao mesmo tempo "blá, blá, blá", e eu começo a escorregar pela parede a baixo, até ficar sentado no chão, ainda com o agrafador na orelha, e com uma das empregadas, de alicate e chave de fendas nas mãos; elas perguntam-me se eu me estou a sentir mal, e eu digo ao meu amigo: "Vai-me comprar um sumol de laranja"...
Texto e Imagem: Vítor Rua